Baden Powell e Vinicius de Moraes - Os Afro-Sambas
- Luiz Eduardo Bedoia
- 3. Juli 2016
- 2 Min. Lesezeit
Em 1963, Duke Ellington estreou pela gravadora Reprise que lhe deu amplos poderes para gravar o que quisesse e como quisesse. Ele fez naquele ano o seu disco mais autoral, já que, embora fosse inquestionavelmente o chefe, normalmente delegava algumas funções. Mas aquele trabalho ele controlou de ponta a ponta, da produção à concepção das composições. Definiu o álbum, em tom de brincadeira, de “une nouvelle vague exotique”, e o batizou de Afro Bossa.
Talvez Vinicius tenha batizado os sambas que fez com Baden parafraseando o título do disco de Ellington. Aí se entende a redundância do expressão “afro-samba”. A começar pelo termo africano que lhe dá nome, o samba é a mais popular manifestação que o Brasil herdou dos africanos que foram trazidos para cá à ferros. Nomenclatura à parte, a coleção de oitos sambas, compostos entre 1962 e 1965, reunidos num único LP. Afro-bossa seria até um nome mais apropriado. Estava ali a bossa nova, com a sacada do canto gregoriano, do candomblé, mais instrumentos de percussão que não cabiam em sua delicadeza. Algumas canções, com o Canto de Xangô, Bocochê são a estilização de cantos e ritmos de terreiros de candomblé, com orquestrações do maestro Guerra-Peixe, e os vocais das baianas do Quarteto em Cy.
Muitas vezes já citei aqui o grande Poetinha Vinicius de Moraes e hoje trago um dos seus clássicos discos... Vinicius e sua poesia desde muito cedo em minha vida ajudou a forjar minha visão de mundo e Baden é o exemplo máximo do virtuosismo, representa plenamente a tradição do violão brasileiro e dessa mistura não poderia surgir nada menor do que o fantástico disco "Os Afro-Sambas".
Vinicius definiu assim essa empreitada - "Quando Baden Powell e eu começamos a compor pra valer, ficamos praticamente sem sair durante três meses. “Samba em Prelúdio”, “Só por Amor”, “Bom dia, amigo”, “Labareda” e o “Astronauta” são dessa safra. Uma das coisas que mais o fascinava era ouvir um disco que meu amigo Carlos Coqueijo me trouxera da Bahia, uma gravação ao vivo de sambas-de roda e cantos de candomblé. Nesse meio tempo Baden deu um pulo a Salvador, onde teve oportunidade de ver e ouvir candomblé e conviver com gente “por dentro” do assunto. A Bahia fez-lhe uma impressão enorme. […] Essas antenas que Baden tem ligadas para a Bahia e, em última instância, para a África, permitiram-lhe realizar um novo sincretismo , carioquizar, dentro do espírito samba moderno, o candomblé afro-brasileiro, dando-lhe ao mesmo tempo uma dimensão mais universal".

O disco é um divisor de águas na MPB por fundir vários elementos da sonoridade africana ao samba, "Os Afro-sambas" é o segundo LP lançado pela parceria Baden Powell / Vínicius de Moraes. As oito canções apresentam uma rica e singular musicalidade, que traz uma mistura de instrumentos do candomblé e da umbanda (como atabaques e afoxés) com timbres mais comuns à música brasileira (agogôs, saxofones e pandeiros).
A mística dessa parceria é a sua capacidade de reconexão imediata com nossas raízes africanas. Destaco a capacidade de Vinicius de compreender a cosmogonia africana e transforma-la em música/poesia...
Sarava!
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